Fonte: Gama Livre |
Os documentos “Uma Ponte para o Futuro” e “A
Travessia Social”- ambos elaborados pela Fundação Ulisses Guimaraes (Partido do
Movimento Democrático Brasileiro - PMDB) - revelam a direção que Temer pretende
dar a agenda educacional. Nestes documentos é possível apreender que o
significado central do conjunto de ações para o setor é a redução violenta
do gasto social, a privatização e a transformação da educação em fonte de
lucros e excedentes de poder. Neste texto, analisamos parte das medidas
anunciadas para a área da educação, buscando evidenciar uma forte tendência ao desmonte
da educação pública brasileira e à nacionalização de modelos educacionais privados de
inspiração estadunidense, atualmente em implantação em alguns estados brasileiros, mesmo sem pesquisas consistentes e independentes que
comprovem sua eficácia em termos de melhoria da qualidade do ensino. Isso porque, seu principal interesse é transferir a educação nacional para controle o exclusivo de corporações empresariais.
Educação no contexto do ajuste
fiscal
As medidas para área da educação estão inscritas no
documento “A Travessia Social”, a saber:
“1- Prioridade para o ensino fundamental e
médio; 2- Foco na qualidade do aprendizado e na sala de aula; 3- Maior presença
do Governo Federal no ensino básico; 4- Dar consequência aos processos e
resultados das avaliações; 5- Foco na qualificação e nos incentivos aos
professores do ensino básico; 6- Programa de certificação federal dos
professores de 1o e 2o grau, em todo o país, para efeito de pagamento de um
adicional à sua remuneração regular, custeado pela união; 7- Diversificação do
ensino médio, de acordo com a vocação e o interesse dos alunos” (cf.
FUNDAÇÃO ULYSSES GUIMARÃES, s/d, p. 15).
O texto não detalha os significados de cada uma dessas
propostas, mas podemos inferi-los, mediante o entendimento de que o conjunto é
condicionado pela proposta de ajuste fiscal violentamente restritiva para área
social.
Neste sentido, entendemos que, sejam quais forem seus
significados mais específicos, as propostas de Temer para a área de educação estão
enquadradas pela medida inscrita no documento “Uma ponte para o Futuro”, que
prevê um “(...) novo regime
orçamentário, com o fim de todas as vinculações (...)” (Cf. FUNDAÇAO ULYSSES GUIMARÃES, 2015, p. 9).
Isso significa que, para cobrir o déficit orçamentário (despesa maior do
que a receita), estimado pelo governo em R$
170,5 bilhões (CARTA CAPITAL, 24/05/2016), o governo pretende buscar a
revogação dos dispositivos constitucionais que obrigam os governantes investirem um mínimo do orçamento público em áreas essenciais como a previdência
social, a saúde e a educação. Portanto, o contexto orçamentário no qual as
propostas acima seriam implementadas é de ampla liberalização, em função do desmonte
das garantias constitucionais.
Para análise da questão, antes de mais nada, importa
salientar que o financiador majoritário do Estado brasileiro é a população de
menor renda, uma vez que o segmento remunerado com até três salários mínimos é o que mais gera arrecadação de tributos no país.
Conforme os dados do Conselho de Desenvolvimento
Econômico e Social (CDES), o Brasil tem caminhado no sentido contrário ao da
justiça fiscal. Isso porque, “(...) aqueles que contam com maior nível de rendimento e
estoque de riquezas deveriam contribuir proporcionalmente mais com pagamento de
tributos” (p.15). Contudo, estudos demonstram que, em 2004, as pessoas que
ganhavam até dois salários mínimos gastaram 48% de sua renda no pagamento de
tributos. Já o peso da carga tributária para pessoas com renda superior a 30
salários mínimos correspondia a 26,3% (CDES, 2010).
Outro estudo, do Instituto Brasileiro de
Planejamento e Tributação (IBPT), realizado com base no Censo 2010, 79% da população
brasileira, que recebe até três salários mínimos por mês, contribuem com 53% da
arrecadação tributária total (IBPT, 2014).
Segundo o livro Sistema Tributário e
Seguridade Social: contribuições para o Brasil (SINDIFISCO NACIONAL,
2014), o Brasil possui uma das cargas tributárias mais regressivas e
injustas do mundo. Regressiva porque, mais da
metade da arrecadação tributária advém do consumo (impostos indiretos), além de
uma parcela considerável da receita pública ser destinada ao pagamento de
encargos da dívida, beneficiando os rentistas, por sua vez, já privilegiados pela menor
tributação. Segundo o relatório citado, em 2012 a arrecadação tributária
alcançou 34,84% do PIB (R$ 1,53 trilhão). Desta receita, 54,63% (R$ 837,91
bilhões) da arrecadação das três esferas de governo (federal, estadual e
municipal) foi gerada através do consumo. O fato é que na tributação do
consumo, o consumidor paga indiretamente o valor que seria de responsabilidade
das empresas, pois este é repassado para os preços das mercadorias e serviços.
Outros 27,24% (R$ 417.84 bilhões) foram tributados da renda e apenas 3,76% (R$
57,61 bilhões) vieram da tributação do patrimônio, o que é irrisório e
determinante da concentração de riqueza. 14,37% (220,45 bilhões) são
classificados como outros tributos, o que inclui FGTS, taxas estaduais e
municipais, previdências estaduais e municipais, etc.
Comparada aos países da Organização para a Cooperação
e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a participação dos tributos indiretos na
carga tributária é bastante exagerada. No Brasil os tributos incidentes sobre
bens e serviços, renda e propriedade representaram, em 2007, cerca de 46,8%,
22,1% e 34% respectivamente, da carga total de 34,8% do PIB. Nos países da OCDE
essas proporções atingiram cerca de 30,4%, 36,9% e 5,4% de uma arrecadação
total de 35,8% (CDES, 2010).
Ainda, de acordo com os dados do IBPT (2013), o Brasil
tem a maior carga tributária dos países que compõem o grupo BRIC: Brasil, 36%
do PIB; Rússia, 22%; China, 20%; Índia, 13%; África da Sul, 18%. Como se vê, a carga tributária brasileira soma
quase o dobro da média dos demais países que formam o BRIC.
Mas, se por um lado, o Brasil possui uma carga
tributária semelhante aos países desenvolvidos, por outro, o retorno social é
baixo em relação à mesma. Estima-se que apenas 10,4% do
arrecadado retornaram à sociedade na forma de investimentos públicos em
educação (4,7%), saúde (3,7%), segurança pública (1,4%) e habitação e
saneamento (0,6%) (CDES, 2010).
Desta forma, na perspectiva da justiça fiscal, a
vinculação de receitas para a área social é o mínimo que se pode exigir, como
benefício que deve retornar ao contribuinte majoritário na forma de direitos
sociais. É neste sentido que a Constituição Federal de 1988 (CF) obriga os
governantes investirem um mínimo do orçamento público nas áreas sociais. Na
educação, a CF prevê que sejam aplicados, no mínimo, 18% do orçamento federal,
25% dos orçamentos estaduais e do DF, e 25% dos orçamentos dos municípios, na
Manutenção e Desenvolvimento do Ensino (MDE). Isso inclui, entre outras coisas,
investimentos na infraestrutura das escolas, formação continuada e
principalmente nos salários dos professores. Sem essas vinculações de receitas,
a política educacional brasileira passaria a ser financiada de acordo com a
“vontade política” dos governantes de plantão, para os quais, na maior parte da
nossa história, a educação do povo nunca foi uma prioridade.
Entretanto, se sob o governo Temer a educação
pública perde, ganham os 20 mil grupos familiares (cerca de 10% da população
brasileira), que se apropriam de 70% dos juros da dívida (FIGUEREDO,
2008) e continuarão auferindo lucros exorbitantes. Isso porque, o superávit
primário (a poupança para pagamento dos juros da dívida pública) no governo
Temer, continuará incólume, remunerando um pequeno
grupo de pessoas e instituições, que são detentores de títulos públicos e que
possuem recursos para pressionar o Estado.
Como mostram os
dados da Auditoria Cidadã, do orçamento federal executado em 2014, 45,11% foram
destinados ao pagamento de juros e amortizações da dívida, consumindo R$ 978
bilhões. No mesmo ano, apenas 3,73% foram destinados à educação
e 3,98% à saúde. Em 2015 a dívida consumiu 42% do gasto federal, chegando
a R$ 962 bilhões, o que corresponde à 12 vezes o que foi destinado à educação
ou 11 vezes os gastos com saúde. Isto
apenas para exemplificar que o rombo do orçamento público está no sistema da
dívida e quem paga esta conta são os brasileiros de menor renda através dos
impostos.
Isso demonstra que o Estado brasileiro age como uma
espécie de “Robin Hood às avessas”, roubando dos mais pobres para entregar aos
mais ricos, mediante uma carga tributária regressiva e injusta; e uma dívida
pública ilegítima, ilegal e nunca auditada. Desvincular receitas neste contexto,
significa retirar recursos da educação e da saúde, e transferi-lo para especulação do capital nacional e internacional,
estreitando ainda mais a possibilidade de acesso ao conhecimento escolarizado à
maioria da população. A inversão da arquitetura tributária nos sentido progressivo e a auditoria da dívida são bandeiras a serem levantadas contra o desmonte de direitos trabalhistas e sociais.
Mimetizando os Estados Unidos
Quando enquadradas pelo ajuste
fiscal violentamente regressivo, as medidas para área da educação têm seus
desdobramentos previsíveis. A desvinculação de receitas da educação visa criar condições
para ampliação ainda maior do mercado das corporações empresarias da
educação e da indústria educacional, tal como foi feito nos Estados Unidos a partir da década de 1990. Estender os tentáculos do
mercado - já majoritário no ensino superior - à educação básica é o único horizonte provável para a política
educacional, num contexto de desvinculação de receitas. Medidas como as
citadas no início do texto (“prioridade para o ensino fundamental e médio;
“consequência aos processos e resultados das avaliações”; “incentivos aos
professores do ensino básico”; “pagamento de um adicional à sua remuneração
regular”) ganham algum sentido, apenas se admitirmos a privatização da
educação básica como o horizonte de tais reformas.
Nesta perspectiva, a cada dia aparecem mais indícios de que o governo interino pretende aprofundar
modalidades de privatização copiadas dos Estados Unidos, como preconizado pelo
movimento de reformadores empresariais da educação (FREITAS, 2012). Assim, a tendência é o aprofundamento do sistema de Vouchers
(transferência de recursos públicos para o financiamento de estudantes de
baixa renda em instituições privadas) e das políticas de Accountability (responsabilização
dos professores com resultados de testes padronizados) no ensino superior e
médio, como já são os casos do Programa Universidade para Todos (PROUNI) e o
Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico (PRONATEC). No caso da educação
básica os indícios são de uma tendência à nacionalização do modelo Charters
Schools, que são escolas públicas com gestão terceirizada à Organizações
Sociais (OS), sob um contrato de parceria público-privada que estabelece um
sistema de responsabilização. Este modelo teve seu maior impulso na década de
1990, durante o governo George H.W. Bush nos Estados Unidos, sendo
experimentado também em outros países como a Austrália, Suécia e Inglaterra.
Apesar da promessa de melhoria do desempenho escolar, o principal interesse dos
reformadores empresariais foram se revelando como essencialmente comerciais,
como destaca o pesquisador americano John Bellamy Foster (2013):
“O capital financeiro, obviamente, interessa-se
pelas escolas charter, que são: (1) financiadas com recursos públicos, porém
geridas de forma privada e alavancadas em áreas estratégicas por grandes
fundações; (2) não sindicalizadas em sua maioria (e também contra sindicatos;
(3) voltadas para testagem, coleta de dados e tecnologia; (4) geralmente
abertas para um modelo corporativo de organização; e (5) receptora de grandes
fundos, o que exige gestão financeira”(p. 100).
Cabe salientar
que, no tocante à qualidade da educação ou mesmo à melhoria do desempenho
escolar, estas políticas fracassaram nos Estados Unidos e em vários outros
países, conforme vêm denunciando diversos pesquisadores norte-americanos, com
destaque para a doutora da Universidade de Nova Iorque, Diane Ravitch, em seu
livro Vida e morte do grande sistema
escolar americano (2011). Conforme a autora, em 2009 o estado da Filadéfia,
por exemplo, anunciou que suas escolas charters foram um fracasso, uma vez que embora seis de suas vinte oito escolas de ensino fundamental e médio tivessem
superado as escolas públicas, dez apresentaram desempenho inferior. Na ocasião,
pelo menos quatro escolas estavam sob investigação criminal por má
administração financeira, conflitos de interesse e nepotismo. Na Pensilvânia,
os administradores de algumas escolas charters criaram empresas privadas para
vender produtos para suas escolas (RAVITCH, 2011). Em Nova Orleans as escolas
charters fracassaram em atender alunos com dificuldades de aprendizagem,
resultando em processo legal interposto em nome de 4.500 aluno.
Conforme um estudo
nacional realizado entre 1997 e 2006, o alto índice de evasão de professores é
uma forte característica das escolas charters, chegando a quase 40% anualmente,
entre os novos professores e 25% no conjunto dos professores. Isto corresponde
ao dobro da evasão de professores das escolas públicas e acontece porque, em
geral, os professores das charters recebem salários inferiores aos dos
professores das escolas públicas. De acordo com estudo realizado em 2001 sobre
as escolas charters de Michigan, em 2011 o salário médio anual dos professores
das charters era de US$ 31.185, em comparação com os US$ 47.315 dos
professores das públicas (FOSTER, 2013).
Nos EUA o complexo
educacional-industrial é o grande beneficiário da reestruturação das escolas públicas
e da expansão dos modelos empresariais de gestão educacional. Em 2000,
relatório da Bloomberg Business Weenk,
sobre investimentos em educação, projetou que com essa tendência geral à
privatização de escola, o grande concorrente [do setor de educação privada] é o
governo mas que, ao longo do tempo, o setor com fins lucrativos irá
sistematicamente apropriar-se deste ramo de atividade do governo (SYMONDS,
2000). As empresas que
mais se beneficiaram da expansão mercantilista da educação nos Estados Unidos, provavelmente, foram as grandes corporações como a Apple, Dell, IBM, HP
(tecnologia); Pearson, Harcout, McGraw-Hill, Thomson (conteúdo didático); CTB,
McGraw, Harcourt Assessment, Thomson, Plato (avaliação).
Importa-nos destacar que, em 2005, o renomado pesquisador educacional Gerald W. Bracey,
publicou um relatório intitulado No Child
Left Behind: Were Does the Money?, no qual denunciou o papel do grande
capital, da corrupção e das propinas na expansão do mercado educacional.
Conforme o relatório, tal expansão teve um duplo padrão, marcado por grandes exigências às escolas públicas e tratamento negligente às corporações
fornecedoras de materiais e prestadoras de serviços que, por exigência legal,
são utilizados pelas escolas (BRACEY, 2005).
No Brasil, análises sobre tais políticas podem ser
encontradas nos estudos do Prof. Dr. Luiz Carlos de Freitas e da Profa. Dra. Thereza Adrião, ambos da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), entre outros.
O Charter
School é o modelo que o Ministro interino da Educação, Mendonça Filho
(DEM-PE), pretende patrocinar sob o discurso de que diminui as despesas do
Estado e de que a gestão privada é mais eficiente do que a pública. Esta foi sua
principal referência quando vice-governador (1999/2005) e governador de
Pernambuco (2005/2006). Nos referimos ao Programa de Desenvolvimento de Ensino
Experimental (PROCENTRO) que, a partir do ano de 2000, reformou o Ginásio
Pernambucano e criou 12 escolas de tempo integral na rede estadual de ensino,
através de parceria público-privada com o Instituto de Co-Responsabilidade pela
Educação (ICE), organização não-governamental, ligada à diversas corporações
empresariais, como a Philips Brasil e o Grupo Gerdau.
No Brasil, este modelo compõe a agenda de forças
políticas neoliberais e neoconservadoras, atualmente em implantação em São Paulo, Goiás,
Rio de Janeiro, Ceará, entre outros estados da federação, com o apoio de várias
instituições ligada à “neofilantropia empresarial”, como a Fundação Itaú
Social, Itaú BBA, Fundação Lemann, Fundação Roberto Marinho e o Instituto
Ayrton Senna, Fundação Walmart, etc. Embora sem sustentação de pesquisas consistentes e independentes que comprovem a melhoria do desempenho educacional onde o modelo foi praticado
há mais tempo, esta é a “ponte” que Temer quer construir para o “futuro” da
educação brasileira. Nossa hipótese é a de que depois da “ponte” privatista, o
“futuro” é a ampliação do atraso e das desigualdades educacionais e socioeconômicas.
Depois da ponte está o abismo.
Atraso educacional brasileiro
Após quase um século de subfinanciamento e atraso
educacional em relação aos países ricos e até mesmo alguns vizinhos
latino-americanos como Argentina, Chile e Uruguai, nas últimas décadas o governo
brasileiro fez um esforço mais sistemático para diminuir o quadro de
desigualdades educacionais e socioeconômicas. Em relação aos gastos
educacionais, entre os anos 2000 e 2013, os investimentos diretos em educação
cresceram do equivalente à 3,9% do PIB (Produto Interno Bruto) para 5,2%,
conforme dados Instituto Anísio Teixeira de Pesquisa Educacional (INEP/MEC,
2016). Entretanto, estes números ainda estão muito longe de alcançarem a
situação ideal, uma vez que o “valor anual por habitante em idade escolar” é um
dos mais baixos do mundo. De acordo com o mais recente relatório da Organização
para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Education
at a Glance (EAG) 2015, o valor gasto por aluno no Brasil, do
ensino básico ao superior, é de US$ 3.441, muito aquém da média dos países
membros e parceiros, que é de US$ 9.317. No início da lista estão Luxemburgo (US$ 21.998) e Suíça (US$ 15.859). E os
quatro últimos são Brasil, México (US$ 3.233), Turquia (US$ 3.072), Colômbia
(US$ 2.898) e Indonésia (US$ 1.809).
Apesar dos esforços para aumentar os investimentos
na área e melhorar os indicadores educacionais e dos relativos êxitos
alcançados, o Brasil ainda está muito longe de um patamar que garanta a
democratização plena das oportunidades educacionais, dado o histórico déficit educacional. Conforme os
dados do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES, 2014), a média
de estudo da população brasileira é de 7,9 anos, menor que a do Chile (9,7), da Bolívia (9,2), do Peru (8,7) e do Uruguai (8,5). Em 2012, a taxa de analfabetos entre
pessoas com 15 anos de idade e mais era de 8,7% (cerca de 13 milhões de analfabetos).
15% das crianças de 8 anos de idade ainda não estavam alfabetizadas. Entre as
pessoas na faixa de 18 a 24 anos, 70% estão fora de qualquer processo
educacional. Na faixa de 15 a 17 anos, apenas 54% cursavam o ensino médio.
Entre os jovens de 15 a 29 anos de idade, praticamente 1 em cada 5 não
estudavam, nem trabalhavam (geração “nem-nem”). No ensino superior, para a
faixa etária entre 25 e 64 anos, observa-se uma taxa de 14% em 2013, nível bem
abaixo de países latino-americanos como Chile (21%), Colômbia (22%), Costa Rica
(18%) e México (19%). A partir destes dados vê-se, nitidamente, que o atraso
educacional brasileiro ainda é enorme, mesmo considerando o crescimento dos
investimentos educacionais feitos na última década.
Inúmeros estudos sobre o financiamento educacional
no Brasil demonstram que para superarmos nosso atraso e atingirmos um patamar
adequado precisaríamos empregar cerca de 10% do PIB, como fazem os países
desenvolvidos (AMARAL, 2010; SALVADOR, 2012; HELENE, 2013). Esta é a meta 20 do Plano
Nacional de Educação (PNE 2012-2024), sancionado em 2014 pela presidenta
Dilma Roussef, após controverso debate na sociedade, sobretudo nas edições da
Conferência Nacional da Educação (CONAE). O PNE prevê também
que os recursos para ampliação do orçamento da educação, sairão dos royalties
do petróleo (75%) e do Fundo Social do Pré-Sal (50%), conforme as leis
12.351/2010 (Lei da Partilha) e 12.858/2010 (Lei dos Royalties). Isto aportaria
mais R$ 134,9 bilhões para a educação até 2022, conforme publicado no jornal “O
Estado de São Paulo”, em 19/08/2013. Mas esta meta, além das inúmeras imprecisões, também está sob forte
ameaça, pois o programa anunciado pelo presidente interino Michel Temer, também
prevê o “desatrelamento das receitas dos
royalties do petróleo e do Fundo Social do Pré-Sal para o financiamento das
políticas sociais”. Esta medida já está em regime acelerado de tramitação
no Senado, através do Projeto de Lei 131/2015 de autoria do senador José Serra
(PSDB), que reduz a participação da Petrobras nos consórcios de exploração na
camada do pré-sal, hoje estipulada em pelo menos 30% dos blocos licitados.
Defender a educação pública da distopia privatista
No dicionário Houaiss o
significado da palavrada distopia que nos parece mais adequado ao
momento refere-se a um “local imaginário, circunstância hipotética, em
que se vive situações desesperadoras, com excesso de opressão ou de perda”. O
termo foi brilhantemente utilizado pelo cineasta Silvio Tendler no documentário
Privatizações: a distopia do capital (2014), para descrever o horizonte
de “antiutopia” aberta pelo neoliberalismo.
Desvincular receitas da educação e da área social
como um todo, significa abrir caminho para transferência da escola pública
brasileira para a distopia privatista. Esta instituição social que
foi construída tardiamente ao longo do séc. XX, mas que teve nos quase 30
anos de Constituição Cidadã seu maior impulso estruturante.
A escola pública brasileira, com todas as suas
contradições, resulta da luta dos trabalhadores e dos movimentos pela
democratização da educação da década de 1980, sendo único meio de a maioria da
população acessar o conhecimento sistematizado historicamente pela humanidade.
Uma vez sob as rédeas de corporações empresariais, a instituição
escolar servirá exclusivamente para uma educação instrumental pró-mercado,
ao controle ideológico e à especulação financeira. Como consequência teremos o
aprofundamento das desigualdades educacionais, socioeconômicas e de poder
político, como já evidenciado em Nova Iorque, Nova Orleans e Chicago (FOSTER,
2013).
A entrega definitiva do pré-sal aos estrangeiros, significa o desmonte de novas possibilidades de financiamento da educação pública tornando, no mínimo incerto, o processo civilizador que a educação escolar seria capaz de impulsionar junto às gerações mais jovens. Para o desenvolvimento econômico e social do país é um golpe mortal, já que sem educação sistemática, pública e de qualidade, o Brasil permanecerá dependente intelectual e tecnologicamente, e subordinado econômica e politicamente. Defender a escola pública brasileira da “distopia privatista” é uma luta a ser travada pelos educadores, estudantes e seus órgãos de representação, e de todos que lutam por um Brasil justo e soberano, pois sem educação pública não há democracia substantiva possível.
A entrega definitiva do pré-sal aos estrangeiros, significa o desmonte de novas possibilidades de financiamento da educação pública tornando, no mínimo incerto, o processo civilizador que a educação escolar seria capaz de impulsionar junto às gerações mais jovens. Para o desenvolvimento econômico e social do país é um golpe mortal, já que sem educação sistemática, pública e de qualidade, o Brasil permanecerá dependente intelectual e tecnologicamente, e subordinado econômica e politicamente. Defender a escola pública brasileira da “distopia privatista” é uma luta a ser travada pelos educadores, estudantes e seus órgãos de representação, e de todos que lutam por um Brasil justo e soberano, pois sem educação pública não há democracia substantiva possível.
Caso essa (des)construção não
seja imediatamente interrompida, a ponte de Michel Temer levará o Brasil a um
futuro de perdas irreparáveis e ao desespero próprio da falta de utopia.
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Um comentário:
Olá Prof. Jamerson. Esse texto terá mais acesso nesta semana. Solicitei aos meus alunos da disciplina de Políticas Educacionais que o lessem para debate e problematização na próxima aula. Abraços.
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