terça-feira, 2 de junho de 2020

EDUCAÇÃO EM PERNAMBUCO SOB O "CHOQUE" DA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA

 AUTORES: Micilane Araújo (Licenciada em Letra, Mestranda em Educação PPGEDU/UFPE) Uérica Araujo (Licenciada em Educação Física, Mestranda em Educação PPGEDU/UFPE) Jamerson A. A. Silva (Doutor em Educação, docente do PPGEDUC/UFPE)

A pandemia da Covid-19 tem revelado de forma dura e inimaginável os principais problemas sociais no Brasil e no mundo. No campo educacional, as contradições ficaram ainda mais visíveis dadas as circunstâncias de desigualdades dos sistemas educativos brasileiros e da realidade socioeconômica dos estudantes que ainda enfrentam severas disparidades regionais de acesso à tecnologia e de oportunidades de ensino. Em razão da suspensão das aulas, o Ministério da Educação, através da Portaria n. 343/2020, regulamentou a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais enquanto durar a situação de pandemia do novo Coronavírus, Covid-19.
 Longe de equalizar o problema criado pela suspensão das aulas, esta iniciativa pareceu intensificar ainda mais os contrassensos da questão educacional brasileira, considerando os limites de acesso aos recursos tecnológicos, sobretudo, quando colocamos em discussão o contexto educacional dos filhos da classe trabalhadora que em sua maioria frequentam a escola pública. Junta-se a isso a insuficiente, e muitas vezes inexistente, formação dos professores no âmbito da utilização e do desenvolvimentos das metodologias ancoradas nas tecnologias digitais. 
Em Pernambuco, o "choque da EAD" vem dividindo a opinião pública em torno da sua eficácia e em relação à sua validade como substituição às aulas presenciais, fato que levou o Sindicato dos Trabalhadores em Educação a entrar com recurso junto ao Ministério Público do Estado, pressionando a Secretaria de Educação a rever as decisões tomadas para o período.
Neste cenário de intensa imprevisibilidade, diversos relatos de gestores, professores, alunos e pais vêm demonstrando uma situação de completo desrespeito no que tange à realização das aulas em meio à pandemia, conforme pode ser constatado em matéria publicada pelo G1 intitulada: Estudantes, pais e professores narram “apagão” do ensino público na pandemia; em 7 estados e no DF atividade remota não vai contar para o ano letivo.
A matéria do G1 traz experiências em várias redes de ensino no Brasil, tanto estadual como municipal. Na sua grande maioria, essas experiências apontam para o improviso com aulas via WhatsApp e outras ferramentas, como também para o sofrimento de alunos com a falta de internet e equipamentos, fatores que parecem indicar para um cenário de "educação de faz de conta", como define o relato de uma mãe de Santa Catarina. Segundo a matéria,

“Alunos da rede pública de todo o Brasil vivem a sensação de que 2020 será um ano perdido em suas trajetórias escolares. Já os professores relatam o drama de não terem a formação e a estrutura necessárias para oferecer o conteúdo remoto. Quando não estão totalmente sem conexão, estudantes e mestres recorrem ao improviso de aulas via redes sociais, por exemplo”.

Todos os estados e o DF adotaram atividades remotas, mas cada estado adotou uma maneira de repassar o conteúdo – plataformas virtuais, sites, TV aberta e até por meio do WhatsApp. Em Pernambuco, a decisão de suspender as aulas presenciais foi tomada em 18 de março, com isso as aulas presenciais foram substituídas pela modalidade a distância, sendo transmitida pela TV e via internet. No entanto, o estado não decidiu ainda se vai usar a educação remota como carga horária do ano letivo.
O cenário de incertezas revelado pela matéria do G1 coloca em evidência a difícil situação dos profissionais que trabalham na rede municipal do Recife que não dispõem sequer de orientações sobre como ocorrerá o esquema de reposição das aulas. O relato do jovem José Miguel Canuto, de 12 anos, demonstra esse cenário:

“Desde o começo da pandemia, estou sem aulas. Não tive, até agora, nenhuma aula on-line, e o pessoal da escola também não falou nada com a gente sobre alguma atividade fora da escola. A única coisa que eu recebi foi um livro de português, quando minha mãe foi busca a cesta básica da prefeitura”.

Esta situação, no entanto, não é exclusividade do estado de Pernambuco. Em Santa Catarina, por exemplo, o aluno Guilherme Soares Machado, 14 anos, relata a falta de padronização dos meios digitais para o desenvolvimento das aulas entre os professores da sua escola:

“Estou passando por três situações: tem matéria em que o professor criou até um canal no Youtube para melhorar a explicação; com outras, o conteúdo passado não está relacionado com a matéria diretamente; e, em outras, para obter ajuda tenho que enviar e-mail para o professor, que em alguns casos não é correspondido. Do meu ponto de vista, o ensino público não está preparado para a EAD [ensino à distância]”.

No levantamento realizado pelo G1, pareceu claro que nenhuma rede estadual de ensino sabe como será a retomada das aulas presenciais. As redes de ensino não sabem afirmar se haverá aulas aos sábados para repor possíveis conteúdos ou se pretendem adotar carga horária estendida. Em geral, elas afirmam que avaliam as alternativas.
Assim, considerando a necessidade de desmistificar a falsa sensação de que a educação remota é a única solução para resolver os problemas educacionais durante este período, bem como uma possível ampliação dessa modalidade de ensino em situação de pós pandemia,  o Grupo de pesquisa “GESTOR – Pesquisa em Gestão da Educação e Políticas do Tempo Livre” irá apresentar uma série de relatos daqueles que estão imediatamente envolvidos com essa questão, quais sejam, professores, gestores, estudantes e responsáveis na tentativa de situarmos em que condições essas aulas vêm acontecendo e que leitura esses sujeitos fazem deste novo cenário educacional que se anuncia na rede pública de educação do estado.

REFERÊNCIAS

BARBOSA, E. S. et al. NOTAS SOBRE AS CONTRARREFORMAS EMPRESARIAIS DA EDUCAÇÃO NO CONTEXTO DA PANDEMIA COVID-19:  o “choque” da educação a distância.   Política educacional em debate, Blog do  Prof. Jamerson Silva, maio de 2020. Disponível em: https://blogdejamerson.blogspot.com/2020/05/notas-sobre-as-contrarreformas.html#more


BRASIL.Presidência da República. Medida Provisória n. 934 de 1° de abril de 2020. Estabelece normas excepcionais sobre o ano letivo da educação básica e do ensino superior decorrentes das medidas para enfrentamento da situação de emergência de saúde pública. Brasília, abril de 2020. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2020/Mpv/mpv934.htm


________. Ministério da educação. Gabinete do Ministro.  Portaria nº 343, de 17 de março de 2020. Dispõe sobre a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais enquanto durar a situação de pandemia do Novo Coronavírus - COVID-19. Diário Oficial da União, Brasília, abril de 2020. Disponível em: http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-343-de-17-de-marco-de-2020-248564376


FREITAS, Luiz Carlos. EAD, tecnologia e finalidades da Educação. Avaliação Educacional-Blog do Freitas. [S.I.], abr. de 2020. Disponível em: https://avaliacaoeducacional.com/2020/04/17/ead-tecnologias-e-finalidades-da-educacao